sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Carlota em Weimar

O homem tem de se transformar em ruína. Mas é uma coisa grande e maravilhosa essa ruína e essa idade, e uma invenção risonha da bondade eterna que o homem esteja contente com suas condições e que estas consigam adaptar-se a ele, que esteja de acordo com elas e que sejam tão suas quanto ele é delas. Você envelhece, torna-se um ancião e contempla com benevolência, mas com certo menosprezo, a juventude, o povo composto de pardais. Gostaria de voltar a ser jovem, voltar a ser o pardal de então? O pardal escreveu Werther com uma leveza ridícula, mas já era alguma coisa, para a idade. Mas viver e envelhecer! Isso é que é. Todo o heroísmo consiste em perdurar, na vontade de viver e de não morrer, isto é, só a velhice chega à grandeza. Um jovem pode ser um gênio, mas não pode ser grande. A grandeza está somente no poder, com o peso permanente e o espírito da velhice. Poder e espírito, essa é a velhice e a grandeza, e também o amor. Que é o amor juvenil diante do poder espiritual do amor da velhice? Que festa de pardais não é o amor da juventude diante desse galanteio desvanecedor que a graciosa juventude experimenta quando é escolhida amorosamente pela grandeza da velhice e a eleva, e enfeita sua delicadeza com um poderoso sentimento espiritual, diante da felicidade colorida com que brilha a grande velhice, assegurada na vida, quando a juventude a ama? Obrigado, bondade eterna! Tudo se torna cada vez mais belo, mais significativo, mais poderoso e mais solene. E assim por diante!

A isso eu chamo restabelecer-se. Se o sonho não pode fazê-lo, o pensamento o fará.

(Thomas Mann, Carlota em Weimar, p. 250-251, Ed. Nova Fronteira)

Um comentário:

Pedro Carné disse...
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