segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

97 Dias


Quando a violência é um fato, a resistência é um dever.


Em 24 de Outubro, como todos souberam, foi suspensa a greve na Faetec. Eu, que participei do movimento grevista desde o primeiro instante, e que me fiz presente em grande parte das atividades, não posso deixar de lamentar o que ocorreu…

Lamento que, dessa vez, não posso ser responsabilizado pela suspensão da greve. Retiraram, não apenas de mim, mas de todos os meus amigos, o direito de decidir sobre os rumos de um movimento que nós construímos de maneira tão bonita. Fomos traídos por aqueles que deveriam nos acompanhar na luta. Fomos traídos por alguns dos diretores de nosso próprio sindicato…

Qual foi o motivo que nos fez entrar em greve? O Plano de Cargos e Salários dos servidores da Faetec. Qual foi o argumento apresentado pela ala majoritária do sindicato para nós sairmos da greve? A promessa de que o governo negociará conosco. O mesmo governo que, como vocês puderam acompanhar, colocou a polícia militar e seu batalhão de choque para nos agredir nas ruas.

Qual é a importância desse Plano para a Faetec, vocês poderiam perguntar. É de uma importância inestimável, eu responderia. Uma vez que nossas condições materiais de trabalho são precárias – salas de aula desestimulantes e laboratórios obsoletos são apenas alguns dos exemplos –, dependemos sobremaneira dos profissionais que se dedicam à instituição. Se estes profissionais a abandonarem, o que nos resta? Ou melhor: o que sobra para vocês? Ainda esse ano, como vocês já souberam, a Faetec perderá diversos professores para as escolas federais… No entanto, ainda mais grave do que essas perdas, é aquele abandono psíquico, o olhar traumatizado de quem esteve nas linhas de frente de uma luta intensa e ainda carrega a decepção de ter sido traído por seus “companheiros”…

Nesses momentos, não consigo abrir mão das minhas referências! Durante a Segunda Guerra Mundial, Thomas Mann dizia que “[tinha] a convicção inquebrantável de que Hitler não [podia] vencer a sua guerra – uma crença baseada muito mais em razões metafísicas e morais que em razões militares”. Sinto-me autorizado a parafraseá-lo e afirmar que eu tenho a sólida convicção de que essas pessoas, que abriram mão de sua dignidade ao se prostrar de modo reverente a um dos piores governos da história desse estado, essas pessoas não vencerão essa guerra. Eles não vencerão a guerra que ainda travamos por uma educação pública de qualidade, não vencerão todas as batalhas que ainda se nos apresentam! E não por razões políticas, mas por razões morais… Afinal, eu sinceramente acredito que podemos resgatar o cenário descrito por Mario Vargas Llosa em um de seus livros: “é verdade que, em muitos lugares, a política é ou se tornou de fato suja e vil. “Sempre foi”, dizem os pessimistas e cínicos. Não, não é verdade que sempre foi nem que seja agora em todos os lugares e da mesma maneira. Em muitos países e em muitas épocas, a atividade cívica alcançou prestígio merecido porque atraía gente valorosa e porque seus aspectos negativos não pareciam prevalecer sobre o idealismo, a honradez e a responsabilidade da maioria da classe política”.

Já pude conversar com vocês sobre a importância das palavras de Vargas Llosa. Espero poder conversar muitas vezes mais sobre essas e tantas outras palavras que diariamente me inspiram na prática docente… Porém, diante de tudo o que aconteceu comigo durante essa greve, e do mês de Novembro que se anuncia para todos nós, faço questão de lembrar a máxima com a qual Goethe, meu poeta favorito, encerra sua autobiografia – uma máxima que nos abre para o futuro ao confrontar uma das mais famosas questões filosóficas: Para onde vamos… quem o sabe? Mal nos lembramos de onde viemos...

Nenhum comentário: